Terrível palavra é
um Non. Não tem direito, nem avesso: por qualquer lado que o tomeis,
sempre soa, e diz o mesmo. Lede-o do princípio para o fim, ou do fim para o
princípio, sempre é Non. Quando a vara de Moisés se converteu naquela
serpente tão feroz, que fugia dela, porque o não mordesse; disse-lhe Deus que a
tomasse ao revés, e logo perdeu a figura, a ferocidade, e a peçonha. O Non
não é assim: por qualquer parte que o tomeis, sempre é serpente, sempre morde,
sempre fere, sempre leva o veneno consigo. Mata a esperança, que é o último
remédio, que deixou a natureza a todos os males. Não há corretivo, que o
modere, nem arte, que o abrande, nem lisonja, que o adoce. Por mais que
confeiteis um Não, sempre amarga; por mais que o enfeiteis, sempre é feio; por
mais que o doureis, sempre é ferro. Em nenhuma solfa o podeis pôr, que não seja
mal soante, áspero, e duro.
Padre António
Vieira, “Sermão da Terceira Quarta-Feira da Quaresma” – Pregado na Capela Real,
Ano de 1670