terça-feira, junho 29, 2021

Arte de Amar em Ovídio


Acredita no que te digo: não deve apressar-se o prazer de Vénus,

mas sim, discretamente, fazer por retardá-lo e demorá-lo.

Quando descobrires o ponto onde a mulher se excita ao ser tocada,

não seja o pudor a impedir-te de o tocar;

verás os seus olhos a brilhar de fogo cintilante,

como, tantas vezes, o sol reflecte a luz na superfície da água;

far-se-ão ouvir queixumes, far-se-á ouvir um encantador sussurro

e doces gemidos e palavras apropriadas ao prazer.

Mas não deixes para trás a tua parceira, desfraldando mais largas velas,

nem seja mais rápido o ritmo dela que o teu;

avançai para a meta ao mesmo tempo, então, será pleno o prazer,

quando, a par e par, fazerem, vencidos, a mulher e o homem.

Ovídio, “Arte de Amar”

segunda-feira, junho 21, 2021

Cabo Verde não é África!

 

Quando chega no aviom à África que lhe venderam na passagem aérea, tam cara, o primeiro impulso do européu é pedir a folha de reclamaçom: “Desculpe mas isto aqui nom é África. Eu tirei um bilhete para África. Pode-me dizer para onde fica?”. No bar da coqueta terminal aérea pode ver o Sumol, o Português Suave, os ovos moles de Tentúgal, a cerveja Sagres, e no ecrãn da TV, o jogo do Sporting contra o Porto. Tudo o que tem rótulo apela-nos com familiaridade e provoca o espelhismo de que chegamos a unha jangada na que se prolonga Europa. É a segunda máscara de Cabo Verde. A de que nom é um lugar novo, a de que te tivérom numha caixa troupeleando unhas horas para simular a viagem e estás no mesmo lugar, no velho mundo. A beber cerveja e a comer tremoços.

Quico Cadaval, prefácio de “O Resto é Céu” de silvia penas