Não sendo tão
quente quanto alguns noutros lugares de Angola, Saurimo é um lugar quente,
desertificado, plano, de terra batida, e impõe uma exigência muito grande para
ali se ficar. Essa mesma experiência de tudo conspirar existe ali, e o
misticismo levado ao extremo. Eles acham que ninguém morre por natureza, que se
morre por inveja, por mau-olhado. Mesmo quem vive até aos 102 anos, no momento
em que morre não é de velhice, morre porque alguém lhe rogou uma praga, o
desprezou, lhe desejou a morte. Parece horrível mas é muito bonito. Eles acham
que se conseguirem eliminar as invejas, as cobiças, se conseguirem criar uma
sociedade puramente justa, vão conseguir ensinar a natureza a deixar-nos ser
eternos, porque deixou de haver razão para que as pessoas morram. Ficaremos
velhos e mais velhos porque ninguém nos quererá mal. Esta esperança define-os,
é uma forma de acreditar que o mundo vai ser melhor.
Valter Hugo Mãe, em
entrevista a Ana Sousa Dias, Ler – Livros & Leitores, n.º 128, Outubro 2013
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