segunda-feira, dezembro 07, 2009

Rebeldias


Com razão se tem chamado a atenção para a indócil rebeldia deste órgão, que se subleva inoportunamente ainda, quando dele não precisamos e se acalma, mais inoportunamente ainda, quando temos necessidade do contrário. Tão imperiosamente se impõe à nossa vontade que repele, com indomável altivez e obstinação, tanto às nossas solicitações mentais como as manuais. E apesar de ser censurado e condenado pela sua rebelião, se eu estivesse encarregado de defender o seu procedimento, talvez fizesse cúmplice os outros membros, seus companheiros, de terem escarnecido dele, por pura inveja da importância e doçura das suas funções; de terem todos juntos conspirado contra ele e de o fazerem carregar com a responsabilidade de uma culpa comum. E, se não, considerai se haverá sequer alguma parte do nosso corpo que não se oponha, com frequência mais que sobrada, à determinação da nossa vontade.
Montaigne, “Ensaios”

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