Deus quis que o
islão fosse uma religião mas os homens quiseram fazer dele uma política. A
religião é geral, universal, totalizante. A política é parcial, tribal.
Restringir a religião à política é confiná-la a um domínio estreito, a uma
colectividade, região e momento preciso. A religião eleva o homem para o que
ele pode dar de melhor, a política tende a despertar os instintos mais vis.
Fazer política em nome da religião é transformar esta última em guerras
intermináveis e em divisões partidárias sem fim, é reduzir os objectivos às
posições procuradas e aos ganhos esperados. Por estas razões, a politização do
religioso ou a sacralização do político só podem ser factos de espíritos mal
intencionados e perversos, a não ser que sejam ignorantes. Uma e outra acabam
por fundamentar na religião o oportunismo e a cobiça, por encontrar
justificações corânicas para a injustiça, por rodear a delinquência de uma aura
de fé, e por fazer passar por um acto de guerra santa o sangue injustamente
derramado”.
Muhhamad Said
al-Ashmawy, “L’Islamisme contre l’Islam”
Citações... Acontece em leituras deparar com a frase perfeita, ou um pensamento elaborado tal qual o sentimos e gostaríamos de escrever, ou o espanto da descoberta de um conceito com o qual passamos a concordar plenamente, ou de uma ideia marcada pela incongruência do tempo, etc! É disso que se trata este blog. Não irei escrever nada de meu mas irei citar (apropriar-me) o que é de outros e que a outros pertence.
sábado, dezembro 28, 2013
quarta-feira, agosto 28, 2013
... o livreiro publica a leitura
A escrita, o livro,
a leitura: um mundo! Vasto e complexo mundo! Quem encontrarei disponível para
me acompanhar num breve olhar sobre ele?
Mundo habitado. O
olhar encontra imediatamente os escritores e os leitores. Depois, entre a
escrita e o livro, está o editor com o seu trabalho emérito. Entre o livro e a
leitura estou eu, o livreiro. O
escritor publica a escrita, o editor publica o livro, o livreiro «publica» a
leitura.
Resendes Ventura, “Papel A
Mais – Papéis de um livreiro com inéditos de escritores”
terça-feira, junho 25, 2013
Carteiristas UE
Não há, nunca houve
Europa, no sentido que esta palavra tem em diplomacia. Há hoje um grande pinhal
de Azambuja, onde rondam meliantes cobertos de ferro que se odeiam uns aos
outros, tremem uns dos outros, e, por um acordo tácito, permitem que cada um
por seu turno se adiante – e assalte algum pobre diabo que vegeta ou trabalha
ao canto do seu cerrado. (...) A Europa, como os campos de corridas em
Inglaterra, devia estar coberta destes avisos em letras gordas:
Bewareofpick-pokets! (Cautela com os salteadores!)
Eça de Queirós, Cartas de
Inglaterra (1905)
quinta-feira, maio 30, 2013
Amanhar, sulfatar, camear, desbagoar, cavar...
A
Primavera não concedia tréguas. Era preciso amanhar a terra, sulfatar, camear,
desbagoar e cavar à volta de cada cepa a fossa que reteria a água das últimas
chuvadas; podia não cair nem mais uma gota de água até Setembro.
Suzanne Chantal, “Ervamoira”
Suzanne Chantal, “Ervamoira”
quinta-feira, maio 16, 2013
Cabral sabia...
Cabral sabia. E
insistiu, previu, preveniu: «libertação nacional, luta contra o colonialismo,
construção da paz e progresso, independência – tudo isso são coisas vazias e
sem significado para o povo se não se traduzem por uma real melhoria das
condições de vida.» (“Destruir a economia do inimigo e construir a nossa
própria economia”)
António E. Duarte, “A
Independência da Guiné-Bissau e a Descolonização Portuguesa”
domingo, maio 05, 2013
Enfermo
- Ainda a doença é uma bondade de Deus, Filipe. No nosso ser acordam as pequeninas almas a que não se presta atenção quando se está de boa animalidade. Podia eu alguma vez julgar que até no voo das gaivotas está desenhado o hieróglifo da Divina Graça!? Ao enfermo, porque não tem que fazer, sobra-lhe tempo para dar volta à casa. À casa interior, bem entendido. Que coisas, mal arrumadas umas, imprevistas outras, que ocas e teias de aranha pelas paredes, se não descobrem!? O homem sadio é o que menos se conhece, pois nunca se deu ao trabalho de olhar para dentro de si. O nosso seio, irmão, é uma cisterna lôbrega e só depois de se acostumar a vista à penumbra, se arregalarem bem os olhos, é que se consegue enxergar alguma coisa. O que eu fui encontrar nos meus subterrâneos.
Aquilino Ribeiro, “Humildade Gloriosa”
domingo, abril 28, 2013
Douro sublimado
S. Leonardo de Galafura, 8 de Abril de 1977 – O Doiro sublimado. O prodígio de uma
paisagem que deixa de o ser à força de se desmedir. Não é um panorama que os
olhos contemplam: é um excesso de natureza. Socalcos que são passados de homens
titânicos a subir as encostas, volumes, cores e modulações que nenhum escultor
pintou ou músico podem traduzir, horizontes dilatados para além dos limiares
plausíveis de visão. Um universo virginal, como se tivesse acabado de nascer, e
já eterno pela harmonia, pela serenidade, pelo silêncio que nem o rio se atreve
a quebrar, ora a sumir-se furtivo por detrás dos montes, ora pasmado lá no
fundo a reflectir o seu próprio assombro. Um poema geológico. A beleza
absoluta».
Miguel Torga, "Diário
XII"
sexta-feira, abril 19, 2013
A intenção
Àparte outras
coisas mais simpáticas, o casamento é a transformação de um sentimento privado
numa obrigação pública. Este ou esta amar aquela ou aquele por todo o sempre
com a exclusão de todos os outros e de todas as outras. Quem alguma vez tenha
amado sabe perfeitamente que é isso que apetece, que o amor é eterno e único
durante algum tempo. E depois logo se vê. Mas essa é a melhor justificação que
pode haver para o casamento. A intenção.
Hélder Macedo, “Solteiros e
casados”, “JL” n.º 1106
quinta-feira, março 07, 2013
Língua imperial
Só as linguas dos
povos, que criam imperio, teem direito ao futuro, e, portanto, ao presente
nacional. Nós portuguezes, somos um povo pequeno, mas somos um povo imperial,
cuja lingua alastrou por sobre o mundo, que criámos civilização, e não
simplesmente a vivemos
Fernando Pessoa, “Ibéria – Introdução a Um Imperialismo Futuro”
Fernando Pessoa, “Ibéria – Introdução a Um Imperialismo Futuro”
terça-feira, fevereiro 12, 2013
Ontem e hoje
Sustado no meio do
seu desenvolvimento, Portugal nunca pôde na administração pública compensar a
receita com a despesa, nem economicamente estabelecer o equilíbrio entre a
produção e o consumo, de forma a tornar-se um organismo, satisfazendo-se todas
as exigências da vida social. Por isso, sucedem-se amiúde as catástrofes que a
população expia em silêncio; por isso, os melhores tempos são sempre duma
prosperidade aparente, porque dependem de condições fortuitas, fora da sua
acção.
Alberto Sampaio, “Ontem e
Hoje”, 1892
domingo, fevereiro 10, 2013
Homens superiores!
Eu compreendo o
pessimismo de certos homens superiores e o seu desdém pela opinião das
maiorias. Compreendo a misantropia de certas criaturas dotadas de superioridade
intelectual ou moral. (...) As maiorias são a mediocridade, o tipo médio de uma
dada época. O homem superior sendo o esboço, o embrião, a síntese individual,
de uma época futura, não pode furtar-se de quando em quando pelo menos, a um
sentimento de desprezo pelos homens, pela massa comum da humanidade, pelas
maiorias em suma. A
razão das maiorias é uma força conservadora, a razão dos homens superiores é uma
força criadora. (...)
O direito dos
homens superiores, das minorias criadoras, inteligentes e cultas, é proclamar a
verdade. O direito das maiorias é discuti-la e valorizá-la pela resistência.
(...)
No futuro triunfam
sempre as minorias; a minoria progressiva nas sociedades que avançam e vivem, a
minoria regressiva nas sociedades que recuam e morrem.
Manuel Laranjeira, «Os
Homens Superiores na Selecção Social», A Águia (1.X.1910)
quarta-feira, fevereiro 06, 2013
Rimando
Lá vai o rato
- que pelitrapo! –
a fugir ao gato
pelo meio do mato,
dizendo gaiato:
- Ó mentecapto,
desta bem escapo!
Mas o gato,
nada abstracto,
fino velhaco,
não dá cavaco.
Sem espalhafato
arranja um saco,
feito de trapo,
e um saca-trapo.
No mesmo acto
encontra o sapo,
que ía prò Buçaco
e diz imediato:
- Ò meu beato,
pega-me do saco.
Não sejas pato!
Olha que te mato,
dou com o taco
ou com o sapato,
esfolo, escavaco,
faço num farrapo.
Pega-me no saco,
ganhas um pataco,
comes um naco...
Vai o sapo,
pessoa de tacto
e de recato,
em seu monacato,
a evitar pugilato,
pegou no saco.
E o gato,
barbato,
com o saca-trapo,
rapo que rapo,
tirou o rato
do buraco,
caverna do Caco.
Depois, jenipapo,
o nosso gato,
sem se importar do
sapo
todo timorato,
nada Viriato,
com horror do
facto,
dispensando prato,
sem guardanapo,
nem aparato,
contente e guapo
mais que o
Fortunato
debaixo do cacto,
- corpo di Bacco! –
meteu-o no papo.
Aquilino Ribeiro, “Cinco
Réis de Gente”
sexta-feira, janeiro 25, 2013
Sobre o teatro, segundo Joaquim Benite
A raiva
interiorizada pode ser muito mais violenta do que a “gritaria”. Se um ator
gritar na direção de um espetador, este é afetado emocionalmente por um ruído:
não é a sua consciência crítica que está a ser abordada. (...)
O gesto do ator
deve resultar de um movimento interior dele mesmo, com um significado, senão
redunda no esbracejar, que já Hamlet criticava nos atores: “Por que é que
agridem o ar? Ele fez-vos algum mal?”
Rodrigo Francisco, “Notas
para uma encenação” – a propósito de Joaquim Benite, JL n.º 1101
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