sábado, julho 21, 2018

o mar


8 de Agosto [1908] – O mar. Estas ondas verdes, azuis, brancas, que monotonamente vemos passar fazem sobre o espírito um trabalho de lima, despersonalizando-nos, podam-nos o relevo da própria presença humana. Fica-se embasbacado, fascinado, dominado. Talvez isso explique que a única posição do homem perante o mar tenha sido de simples contemplação.
O mar inumerável, sempre mutável, esgota a nossa fantasia. E quando sentimos esse esgotamento encontramos o mar idêntico, liso, monótono, igual. Através do primeiro momento, o mar domina-nos e dá-nos prazer. Através do segundo, angustia-nos e provoca-nos um mal-estar impreciso, vago.
Para quebrar este jogo teríamos que encontrar a palavra justa e compreensiva para o mar... mas assim que pensamos que a temos, escapa-se-nos como se fosse uma rajada de vento ou o caracol voluptuoso e fugaz de uma onda.
Josep Pla, “O Caderno Cinzento”



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